Viajar

Estamos de mudança de Boa Vista-RR para Curitiba-PR. Pra aproveitar a oportunidade, resolvemos dar uma olhada no jeitão (antropologia, geografia, fotografia, o olhar das pessoas) dessa nossa América do Sul, fazendo a volta pela costa oeste do continente. Nossa "nave-mãe" nessa jornada será um Suzuki Grand Vitara (ano 2010). Estimamos a viagem em torno de 14 mil km, o que pretendemos percorrer em cerca de 40 dias.

Gostaríamos de compartilhar essa experiência com nossos amigos através deste blog, e, com isso, tornar essa jornada não apenas nossa, mas de todos que nos acompanharem. Convidamos vocês a viajar conosco, e a fazer comentários e sugestões.

Escrever sobre a viagem também nos ajuda a criar uma perspectiva de observadores da nossa própria história, o que é sempre interessante.

Assis, Mari e Thaís.

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

25) 30 Dez 2010 - Espírito de Expedição

30 Dez 10
25º dia
De Ambato a Cuenca – Equador
330 km





            A gente sabe que em viagens desse tipo (de mais de mês) chega uma hora que quase nada mais interessa a não ser chegar, nem que seja no destino do dia. A questão é quando vai se atingir esse ponto.

            Pessoalmente, aprecio essa fase, porque parece que se conecta uma energia diferente, o foco do interesse vai mudando das eventuais e voláteis atrações locais para a viagem em si.

            Hoje o dia começou bem, com o céu querendo ficar azul, paisagem altamente inspiradora – vulcões com os picos nevados, montanhas a perder de vista -, estrada boa e bom rendimento. A estrada seguia o tempo todo exatamente por cima da Cordilheira dos Andes, numa altitude média de 3000 a 3400 metros. Nas encostas das montanhas rebanhos de ovelhas sendo pastoreadas por crianças de 9, 10 anos, com os rostos queimados pelo frio e trajando aquelas típicas roupas coloridas, com ponchos e chapéus – muito legal. Mas ao meio dia esse quadro auspicioso começou a mudar. Baixou uma neblina bem fechada e em seguida veio a chuva. Mas continuamos sem problemas.

            Porém, às duas da tarde, ainda sob chuva, ao passar por um povoadozinho, sem mais nem menos, o pneu traseiro esquerdo furou e esvaziou imediatamente (acho que foi uma pedra, porque havia muitas soltas pela estrada). Paramos, troquei o pneu e procurei uma borracharia local pra fazer o conserto do pneu furado. Acontece que o tal furo não era um furo, era um rasgo de uns sete centímetros (do lado interno do pneu)!! O borracheiro falou que conseguia consertar assim mesmo. Meteu um remendo gigantesco e me recomendou não usá-lo na dianteira. Nananão!! Nem na dianteira, nem na traseira nem em lugar nenhum. O coitado agora só serve pra ir pro lixo. Amanhã vou ter que achar um pneu novo pra ficar de estepe.

            Com esse pequeno perrengue de pneu furado perdemos cerca de uma hora e meia e novamente tivemos que alterar nossos planos do dia e ficar numa cidade aquém do que pretendíamos. Paciência.

            Acho que, no fundo, no fundo, ao contrário do que pode parecer à primeira vista, o mais importante e o mais legal mesmo numa viagem como essa é realmente ‘andar’, percorrer distâncias, e, uma hora, chegar. As atrações são quase coadjuvantes da história.

            Mari e Thaís continuam muito bem. A Thaís esteve bem o dia todo, mesmo com inúmeras curvas na estrada, e sem o tal do remédio para enjôo, que cortamos por recomendação médica e opinião própria.

A tripulação estar bem é o grande esteio da expedição.

Força Sempre
























































quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

24) 29 Dez 2010 - "Mitad del Mundo" – latitude zero

29 Dez 10
24º dia
De Quito a Ambato – Equador
200 km

            Beleza, ordem e limpeza não são características fáceis de serem atribuídas a um lugar. Uma gratificante exceção é a região da costa oeste do Canadá, mais especificamente a área das Montanhas Rochosas que fica nos parques nacionais de Jasper e Banff. Ô lugarzinho bonito!! Mas não é uma beleza estanque, dessas que se enquadram num visor de câmera fotográfica. Todo o conjunto desses dois parques nacionais (que de norte a sul devem ter uns 300 km) é perfeito – a natureza, as poucas construções, as duas ou três cidades. Tudo é feito com capricho, com carinho, com um algo mais, e não apenas por obrigação, por necessidade. Andar por aquelas paragens nos dá a sensação de estar numa grande maquete ao ar livre. Tudo isso é memória da belíssima viagem de bicicleta naquela região em 1998. Já a nossa América do Sul...

            Bem, ordem e harmonia não são exatamente o ponto forte do nosso grande sub-continente. Vindo hoje de Quito para a cidade em que estamos agora bateu um cansaço por conta do trânsito confuso, da poluição visual e da sensação generalizada de bagunça e de conseqüente insegurança que esse contexto nos causa.

            Ambato, a cidade em que estamos, tem ruas estreitas, trânsito lento e barulhento, montes de gente nas ruas, música tocando em volume alto pelas lojas e um aspecto nada aconchegante. Mas é como é.

            Começamos o dia sem pressão, quer dizer, sem pressa, por conta de “imposição” do segmento feminino da equipe. Fomos então conhecer um ponto turístico de Quito conhecido como “Ciudad Mitad del Mundo” – um parque com monumentos, museus e lojinhas de artesanato dedicado a marcar e homenagear a passagem da linha do Equador (latitude zero grau, que divide o planeta ao meio) pelo local. Interessante pelo importante marco geográfico, mas o passeio custou caro em tempo, pois o tal parque fica a uns 30 km do centro da cidade, na direção oposta à que tínhamos que seguir. Mas valeu a pena.

            Pensamos em fazer uma pernada curta hoje pra ver como a Thaís ia se readaptar à rotina da estrada após esses dias de stress com hospital e tratamento médico. Cem por cento. Ela está super bem, assim como a Mari.

            O que não anda muito de bom humor por aqui é o clima. Pegamos chuva na estrada e o dia inteiro foi meio cinzento, com muitas nuvens pesadas e esse aspecto de instabilidade no ar.

            Meu sonho do momento é uma estrada em que se possa acelerar sem interrupções e em que a fórmula “tempo x distância” seja menos ingrata... Mas se não der, tudo bem [risos].

Força Sempre



Mari e Thaís no marco da Linha do Equador, que inspirou o nome do país.








Latitude zero grau: passando para o hemisfério sul.



Norte de um lado, sul do outro.











Criançada jognado bola.



Etnia latina.







Um pé no hemisfério norte, o outro no sul.



Chuva na estrada...



terça-feira, 28 de dezembro de 2010

23) 28 Dez 2010 - CNTP

28 Dez 10
23º dia
Quito – Equador

            Afortunadamente a Thaís recebeu alta do hospital hoje de manhã e parece muito bem, de volta à normalidade. Está comendo bem, brincando e alegre novamente.

            O médico que a atendeu durante a internação considerou que não há qualquer impedimento para o prosseguimento da viagem, contanto que tomemos alguns cuidados com alimentação e hidratação. Ao que parece, o que houve foi uma grave crise intestinal, que pode ter tido várias causas.

            À tarde procuramos um médico acupunturista para fazer uma consulta complementar. Ele fez uma cuidadosa análise dos pontos de energia da Thaís e depois fez umas aplicações de raio laser e também nos orientou com relação  à alimentação e outros detalhes do dia-a-dia.

            Estamos numa fase um tanto delicada da viagem, pois já estamos um pouco desgastados pelas três semanas que estamos nessa vida de cigano e ainda falta bastante pra começar a dar aquela sensação de que está chegando. Pelos meus cálculos devemos estar próximos da metade. E agora ainda tivemos esse abatimento do ânimo e da confiança decorrente desse problema com a Thaís... Mas é isso.

            Estou começando a ficar um pouco preocupado com o nosso cronograma/ calendário. Por mais flexibilidade que achamos que temos, na verdade, temos alguns limites de tempo e compromissos que requerem nossa presença no Brasil em algumas semanas. Vamos ver como vamos evoluir e como vamos lidar com isso.

            Temos sentido Quito como uma cidade bem simpática e muito bem estruturada. Trânsito organizado e administrável, ruas limpas, prédios bonitos, povo receptivo e atencioso, comércio bem diversificado e de boa qualidade e temperatura muito agradável, chegando a fazer frio de manhã cedo e à noite. Em volta da cidade, altas montanhas. No final da tarde, circulando pela cidade, presenciamos um fenômeno como uma nuvem entrando pelos prédios e encobrindo-os. Muito interessante e bonito.

            Ainda estamos pensando se prosseguimos amanhã ou se ficamos mais um dia. Vamos sentir o astral do dia e aí decidimos.

Força Sempre






P.S: Adicionei algumas fotos novas na postagem do dia 24 Dez.


segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

22) 27 Dez 2010 - Uma pontinha de céu azul em meio à tempestade

27 Dez 10
22º dia
Quito – Equador

            A viagem ao Nepal, mais especificamente ao Himalaia (campo base do Everest e dois vales adjacentes, com a escalada do Island Peak, fora a clínica de caiaque e a trip de rafting antes e após ir para a montanha), em 1996, foi das mais duras e surpreendentes que já fiz. E, acho, a que mais me marcou. A sensação de estar num lugar como aquele, em que tudo é extremo – silêncio, altitude, frio, isolamento, distância, rusticidade, imensidão – mexe com a psique, literalmente (ainda hoje lembro de sonhos que tive naqueles dias que pareceram mais reais do que a realidade que vivia). Estávamos o tempo todo no limite – da resistência física, da segurança, do conforto mínimo - , o tempo todo havia uma tensão invisível no ar. Não é um lugar bom pra ter qualquer tipo de problema. Mas, curiosamente, e paradoxalmente, é um tempo que parece ter outra dimensão nas minhas lembranças e vivências... Também não foi só o absurdo espetáculo que é aquela região. A fase da vida, a idade, os devaneios daqueles tempos fazem parte da viagem tanto quanto as incríveis paisagens e experiências...


            A Thaís finalmente está bem melhor. Ainda estamos no hospital, mas acreditamos que provavelmente amanhã ela terá alta.

            O tratamento e atenção do médico que está acompanhando-a realmente nos cativou e tranqüilizou muito. Ele parece ser o próprio modelo de médico atencioso e dedicado. Coisa rara de se ver. E bonito também.

            Em tudo há vivência e aprendizado. Mesmo nos momentos mais difíceis e indesejados. O problema, como sempre, somos nós e nossos velhos esquemas mentais... Limites e capacidades. Análises, avaliações, sentimentos...

            Sou um fanático admirador de histórias de montanhismo e alpinismo (entre outros temas, logicamente...). E uma questão sempre presente e muito interessante numa escalada é a de quanto insistir, ou persistir, rumo ao topo...

            Paralelos com o dia-a-dia não são mera coincidência.


Força Sempre

domingo, 26 de dezembro de 2010

21) 26 Dez 2010 - Foco

26 Dez 10
21º dia
Quito - Equador

            A Thaís continua internada, mas está um pouco melhor. Todos os exames deram resultado normal e ela não tem tido febre. Entretanto permanece no soro e ainda com alguns enjôos.

            O atendimento dos médicos e enfermeiras tem sido impecável, assim como a estrutura, organização e funcionamento de forma geral do hospital.

            No momento só o que nos interessa é ver a Thaís bem e com um sorriso no rosto.

            É uma fase ruim, mas vai passar.

           Queremos agradecer as mensagens de apoio dos amigos e familiares e tranqüilizá-los com relação a essa situação. Ainda não podemos dizer que está bem, mas está sob controle.



Força Sempre

20) 25 Dez 2010 - Fé

25 Dez 10
20º dia
Quito - Equador

            Meus amigos, lamentavelmente a Thaís foi acometida por um forte mal-estar e está internada no Hospital Metropolitano aqui em Quito.

            Os exames iniciais indicaram uma possível infecção.

            Estamos fazendo todo o possível para que ela fique boa logo.

           

Força Sempre

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

19) 24 Dez 2010 - Feliz Navidad

24 Dez 10
19º dia
Quito – Equador

            Neste nosso pequeno-grande planeta somos todos, a um só tempo, muito diferentes e muito parecidos uns com os outros. Cada um de nós tem o seu mundo, a sua história, os seus sonhos, os seus limites, e temos também condições bem parecidas – viver bem, em paz, ter amigos, ser amado, amar - , mas apenas por um certo tempo, ou por um incerto tempo...

            Enquanto isso, um Feliz Natal a todos os nossos amigos e familiares. Que essa data especial seja um motivo para refletirmos sobre nossas vidas e nossos valores, e que sejamos capazes de reconhecer e dar valor ao que é realmente importante.

            Paz e luz.


Força Sempre
























































 Teleférico em Quito - 1000 metros de ascensão em 15 minutos.



Ceia de Natal no hotel.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

18) 23 Dez 2010 - Quito

23 Dez 10
18º dia
De Tulcán a Quito – Equador
263 km

            Houve uma época, não muito distante, em que fotografia era na base dos rolos de filme, e se pensava bem antes de apertar o botão para abrir o diafragma da máquina. E as fotos só podiam ser vistas depois de reveladas; normalmente vários dias depois. E era comum mandar cartões postais dos locais visitados em viagens – cartões esses que levavam dias, ou semanas, pra chegar. E ouvíamos músicas de fitas cassete, em aparelhos tipo walkman que consumiam pilhas vorazmente... Informações de viagem só eram disponíveis em guias de viagem, ou, eventualmente, nas poucas revistas especializadas no assunto. Na volta das viagens, montávamos grandes álbuns de fotos, que compartilhávamos apenas com os amigos mais próximos, em animadas conversas lado a lado. E os diários de viagem eram pequenos cadernos de espiral, em que escrevíamos histórias que ninguém nunca ia ler.

            Hoje esses aspectos mudaram radicalmente, mas a magia de conhecer lugares distantes, diferentes e além dos nossos horizontes mentais continua o mesmo. Assim como nossos receios, nossas dúvidas e nossa capacidade limitada de absorver esse mundo tão diverso e mutante.

            Ainda bem que nem tudo mudou.

            Fizemos uma pernada tranqüila hoje de Tulcán aqui para Quito. A primeira grande diferença em relação à Colômbia é a qualidade das estradas: muito melhores por aqui – asfalto de boa qualidade, boa sinalização e um aspecto geral de organização e bons cuidados.

            A moeda do Equador é o dólar americano, e os preços, de forma geral, são bem mais em conta do que no país anterior.

            A paisagem continua belíssima, com as estradas seguindo bem em cima da Cordilheira dos Andes, a uma altitude média de 2500 a 3000 metros. Muitas curvas e encostas altíssimas completam o quadro inspirador.

            Instalamo-nos num desses hotéis de alto padrão aqui em Quito (2700 metros de altitude), para recompensar a tripulação pelos esforços desses dias incertos de estrada e para nos dar certo alento nesses dias tão nostálgicos que são esses que cercam o Natal. E, em que pese todas as teorias em contrário, temos que convir que, pelo menos de vez em quando, é muito bom um pouquinho de bons tratos.
            Pretendemos ficar por aqui amanhã (dia 24) e o dia seguinte. Na hora exata de dar uma parada. Pra conhecer um pouco dessa cidade que nos pareceu, a princípio, tão auspiciosa, pra descansar um pouco mais, pra refletir com um pouco mais de profundidade sobre a viagem até aqui e sobre essa data tão especial que é o Natal. Além do mais, era um compromisso assumido com a Thaís o de passar o Natal num lugar legal. Aí está.

Força Sempre

           


Habitantes locais, em Tulcán.



Mari e sua incrível comunicabilidade.








Gasolina: US$ 2,25 por galão (=4 litros), ou seja: US$ 0,56 por litro, ou mais ou menos R$ 1,02 por litro (da gasolina mais cara - SUPER).



Pedágio: mais ou menos US$ 1,00 a cada 90 km.



Estrada nas encostas.




A caminho de Quito.


           

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

17) 21 e 22 Dez 2010 - Perrengue

21 e 22 Dez 10
16º e 17º dias
De Popayan – Colômbia a Tulcán – Equador
58 km + 260 km

            Ontem, dia 21, acordamos às cinco da manhã e resolvemos partir pra “briga” com aquela história do bloqueio na estrada. Configuramos nosso “sistema psicológico” no modo “o que vié nóis traça” e fomos pra estrada.

            Quinze quilômetros depois da saída da cidade já estávamos parados na fila de caminhões e carros. No dia anterior tínhamos ido até o km 38 até encontrar a fila. Sinal de que o problema, em vez de estar diminuindo, estava aumentando. Nada bom. Ficamos cerca de meia hora pensando em alternativas, cronograma, mapa, etc. Aí a fila andou e andou bem. Fomos mais ou menos rápido até o km 35, o que nos deu uma certa esperança de que a situação seria digerível.

            Nesse ponto começou a longa espera. A enorme fila andava muito, mas muito devagar. O tempo foi passando e praticamente não saíamos do lugar. Mas mantivemos nossa determinação em prosseguir e nos engajamos irreversivelmente no combate.

            Compreendemos que a única opção era realmente esperar. Toda aquela gente estava na mesma situação e, de certa forma, isso nos dava certo alento. Apesar de ter chovido toda a noite anterior, nesse dia não estava chovendo, o que também era bom.

            A situação parecia também um pouco mais organizada do que no dia anterior. A Policía Caminera estava sempre presente e atuando firmemente para manter a ordem da fila e evitar que os “espertinhos” passassem à frente.

            Mas, apesar de tudo, por volta das quatro da tarde tínhamos andado só uns dois quilômetros desde as nove da manhã.

Chegamos então a um ponto em que havia uma estradinha de terra e pedra que diziam que cortava o caminho, “mas solo para veículos camperos (4x4)”, diziam os moradores locais. Senti que era encrenca. Além disso, a maioria dos carros da fila não encarou o tal desvio. Resolvemos arriscar. Entramos na tal trilha – que era realmente bem apertada, inclinada, escorregadia e meio temerária, principalmente considerando o contexto, mas passamos bem - e 4 km depois voltamos à estrada principal, ainda no engarrafamento, mas certamente ganhamos um tempo precioso.
Às cinco e meia, pouco antes de escurecer, estávamos a cerca de dois quilômetros do local em que a estrada havia ruído. A Mari foi fazer um reconhecimento no local (andando) e voltou quase uma hora depois eufórica com o quadro de caos que viu. Contou cento e vinte carros e caminões na nossa frente, até o local da passagem.

Já estávamos preparados para passar a noite no carro, pois a notícia que circulava era que quando escurecesse as máquinas parariam de trabalhar e a passagem seria fechada até o dia seguinte.

Acontece que um trecho de aproximadamente cem metros da estrada desapareceu levado pela chuva. A operação de emergência do governo montou um esquema em que as máquinas trabalhavam cerca de uma hora colocando terra e pedra nesse trecho e então liberavam para o trânsito. Como havia muitos caminhões e carretas pesadas passando, rapidamente o conserto improvisado se deteriorava, e então interrompiam novamente o trânsito e entravam as máquinas.

Para nossa sorte, a fila continuo andando, ainda que vagarosamente, mesmo após anoitecer, e às nove e quarenta da noite passamos pelo fatídico trecho do desmoronamento – cenário realmente assustador e trágico. Mas o congestionamento continuou do outro lado até por volta da meia noite. Só então começou a voltar ao normal.

Nessas longas horas de espera acabamos fazendo amizade com dois senhores, colombianos, moradores das cidades próximas, que estavam um pouco atrás de onde estávamos na fila. Tivemos ótimas conversas sobre a situação do país, a guerrilha, a questão da segurança pública e outros assuntos. Os dois são irmãos, estavam cada um no seu carro, indo para cidades diferentes e nos deram uma grande ajuda e apoio. Seguimos com eles, em comboio, após passar pelo ponto do desmoronamento até por volta de uma e meia da madrugada, quando eles nos deixaram numa pousada na beira da estrada e seguiram viagem até um pouco mais à frente.

Hoje, dia 22, saímos por volta das nove e meia da manhã e prosseguimos nosso caminho. Aliás, belo caminho. Altas montanhas, altas encostas e a estrada desafiando a geografia...

Chegamos às três e meia da tarde a Ipiales, a cidade colombiana da fronteira com o Equador. Liguei para o senhor Gabriel, um dos irmãos que nos acompanhou na noite anterior e que mora nessa cidade e rapidamente ele veio nos encontrar para nos acompanhar nos procedimentos da aduana – gentileza que ele fez questão de fazer e que não tive como recusar.

Pouco antes da aduana encontramos novamente os nossos amigos brasileiros de Nova Iorque. Mas só uma parte do grupo deles. Um dos carros, a pick-up, havia ficado para trás no congestionamento e ainda não havia chegado. E eles estavam sem contato e sem saber onde os companheiros estavam... Contamos a eles que na noite anterior, quando a Mari saiu para fazer aquele reconhecimento, cruzou com eles cem carros à nossa frente na fila. Ou seja, teoricamente já era para eles terem chegado. Mas, apesar do desencontro, os quatro com quem falamos estavam bem e otimistas que em breve os outros dois chegariam.

Partimos então para a aduana e, apesar de já ser um pouco tarde para dar início a esse tipo de tarefa, incrivelmente em cerca de duas horas conseguimos resolver todos os carimbos, assinaturas e verificações necessárias e estamos liberados para rodar pelo Equador.

Instalamo-nos num hotelzinho na cidade equatoriana próxima à fronteira e amanhã a idéia é seguir até Quito, a capital, aonde pretendemos passar o Natal.

Então está encerrada a etapa Colômbia da viagem. E deu trabalho essa fase! O prognóstico para o Equador é bem melhor do que o do país que acabamos de passar, principalmente em termos de segurança, mas também (e espero que isso se confirme) nos quesitos estrada e beleza natural. Vamos ver.

Minha tripulação está ótima e agüentou o tranco do perrengue de ontem de forma admirável. Brincando, fazendo graça, puxando conversa com as pessoas, e até fazendo miojo dentro do carro! Uma beleza [risos]. Mari e Thaís ficaram até um pouco decepcionadas por não termos passado a noite no carro, tão preparadas e animadas estavam para a aventura.

Força Sempre




 Na fila.



 Longa espera.



 Mari expandindo os limites do improviso.



 Thaís estudando geografia in loco.



 Na trilha que nos encurtou um bom caminho.



 De noite, assistindo a um filmizinho.



 Outros "derrumbes" na estrada.







 Jeito colombiano de andar de ônibus.



 Misto de caminhão com ônibus.



 O encontro com os nossos compatriotas de Nova Iorque, na fronteira com o Equador.